Caro Estranho,
Tenho uma doença autoimune, que me causa dores fortes e uma série de outros problemas 24 horas por dia. No entanto, para quem me vê de fora, parece que não há nada de errado comigo, pois aparento ser saudável. A questão é que estou cada vez mais perto da ideia de desistir de tudo, porque não dá para contar com a empatia de ninguém, nem da minha própria família. Por favor, me ajude.
Obrigada por me ouvir,
Marcela
Cara Marcela,
É com o coração nas mãos que lhe escrevo esta carta. O ano era 2020, quando sofri um acidente que, para a minha surpresa, me causou a fratura de dez vértebras. Só fui entender aquilo quando descobri que, desde antes do ocorrido, havia em mim um histórico de osteoporose precoce. Na ocasião, a minha mãe me falou uma frase que nunca vou esquecer e queria compartilhar com você. “Diagnóstico não é destino”, ela afirmou. Por isso, antes de tudo, sinto demais por você, minha cara, mas nunca, jamais, deixe que essa doença a defina, nem se esconda atrás dela.
No entanto, a minha história não acabou. Após 12 dias internado e uma intervenção na coluna, sobrou em mim uma dor crônica. Assim como você, sinto-a o tempo todo, sem um momento sequer de alívio. Sim, tive de me adaptar a ela e aprender muito nos últimos quatro anos. E, na verdade, foi por isso que essa carta que você me mandou bateu forte em mim. Só queria poder abraçá-la, mas neste momento, o que nos cabe entender é que somos muito mais do que essas dores. Quando lhe digo que não podemos nos esconder, é porque brilhamos mais do que elas. Somos todo um mundo a ser explorado e temos de lutar a cada dia, a despeito da empatia alheia.
Quanto à ideia de desistir de tudo, também sei como é. Porém, estou certo de que isso ocorre mais em momentos de desespero, não é? Você tem contado com a ajuda de alguém treinado para escutar? No nosso caso, é imprescindível, Marcela. De resto, não vou lhe cobrar nada. Os médicos, ou até a família, já devem fazer muito isso. Por fim, confesso. Hoje foi um dia em que acordei sem energia. Mas estou aqui, contente por ter tentado ajudá-la. Viu como vale a pena?
Um grande abraço,
Estranho